Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

QUANTO MAIS QUENTE MELHOR

QUANTO MAIS QUENTE MELHOR

NUNCA POR CALADOS NOS CONHEÇAM

De que lado está o FACEBOOK?

Publiquei há dias um comentário sobre um artigo do Facebook no qual, claramente, se defendia a posição da Rússia em relação à guerra da Ucrânia.

Recebi hoje esta comunicação a informar que o comentário foi elimidado por ser um incentivo ao ódio e que eu ficaria suspenso por dois dias.

Claro que, aos administradores dessa rede social, não lhes vou dar confiança para lhes responder.

Enfim, o lápis azul continua... 

SensuraFace.jpg

Para quem gosta de ler

     

Estilhaços.jpeg

 

      Por muito que se escreva sobre a Guerra Colonial, há sempre muito que fica por escrever. Pelo que, cada obra que apareça a tratar deste tema, é sempre bem-vinda. A que aqui apresento pode ser um relembrar para uns, esclarecedor para outros mas, para todos, é com certeza uma boa oportunidade para meditar.

      Esta guerra em particular tem os seus aspectos específicos que a fazem diferente daquelas a que estamos habituados a observar. Há e haverá sempre aspectos mais ou menos esquecidoa que convém aclarar.

      Travada a milhares de quilómetros doPortugal europeu, envolvendo três teatros de operações, o conflito estava condenado ao fracasso ainda antes do seu início pelas seguintes razões:

  1. Em primeiro lugar, porque o inimigo não eram propriamente os homens dos movimentos independentistas . O verdadeiro inimigo era o conjunto das potências que financiavam a guerra e se serviram dos anseios legítimos das populações para atingir a sua finalidade: eliminar a administração portuguesa dos territórios africanos. Inimigo este, contra o qual não tínhamos meios para prolongar eternamente as hostilidades.
  2. Em segundo lugar, porque, passado o entusiasmo inicial do “Angola é nossa”, os portugueses em geral perderam a fé na vitória e a vontade de combater. Quem podia, pobres e ricos, civis e militares, furtavam-se à guerra por todos os meios ao seu alcance. Uns emigravam clandestinamente, outros moviam influências de modo a que a gerra fosse travada pelos filhos dos outros. Será bom lembrar que a finalidade da guerra não é propriamente matar os inimigos todos, porque basta tirar-lhes a vontade de combater.

      E é, enquadrado por este cenário, que o Coronel Da Força Aérea Luís Alves de Fraga, que dispensa apresentações, publicou uma obra notável e original em que foca em pequenos capítulos os mais variados aspectos importantes desta insensata e longa guerra.

 

 

No Fim da Guerra

EPSON037R copy.jpg

Por alturas de 1973, dizia-se que em Angola a guerra estava praticamente ganha (vá-se lá saber o que é uma guerra praticamente ganha). Talvez porque no Norte de Angola, na região dos Dembos onde começou a guerra, tudo parecia calmo.

Mas o que se passava era bem diferente. A FNLA, movimento guerrilheiro que dominava a zona, tinha simplesmente mudado de estratégia.  Em vez de confrontar a tropa portuguesa, passou fugir dela e a exercer o esforço sobre a população que tinha debaixo do seu controlo. Nas densas matas dessa região tão montanhosa, viviam alguns milhares de angolanos guardados por milícias locais. Assim, com o apoio dessa gente, foram criados corredores de aproximação para os guerrilheiros. Estes atravessavam o rio Zaire, caminhavam vários dias de aldeia em aldeia, e aí recebiam alimentação, alojamento e até algum “conforto” feminino. Este quase sempre forçado. Os objectivos eram quase sempre povoações situadas cada vez mais perto de Luanda. Pela calada da noite, flagelavam as instalações, raptavam mulheres, saqueavam cantinas, matavam quem podiam.

As nossas tropas, tentando combater essas infiltrações, viam-se obrigadas a patrulhar constantemente a região, tarefa desgastante e arriscada,  para destruir as lavras e recuperar a população para o nosso controlo. Esses recuperados iam engordar as sanzalas já existentes e pouco ou nada faziam para voltar para a mata.

Entretanto alguns deles informaram que lá onde viviam, os milícias que os guardavam espalharam o boato de que as nossas tropas matava os capturados mal chegassem ao quartel.

Foi então que o meu Comandante de Batalhão teve uma ideia luminosa: fotografar os recém chegados na companhia dos residentes há mais tempo. Depois, em saquinhos de plástico, foram colocadas essas fotos nos carreiros de pé posto que abundavam na mata.

E foi por essa razão que este grupo, farto de sofrer nas matas, se apresentou em Zemba.

Porém, este procedimento não teve seguimento porque, com os acontecimentos do 25 de Abril de 1974, se pôs termo à guerra.

 

 

 

Almoço convívio - convite

 

 

2640C.jpg

Combatentes do Esquadrão de Reconhecimento Fox 2640

27º Almoço Convívio /4 de Maio de 2019 Tomar

Restaurante Quinta da Gracinda Matues,Vale Donas, 96 Tomar, Tef. 249310290

Caro amigo e família decorridos que são 48 anos do nosso regresso á Metrópole, vamos nesta data comemorar e assim realizar o nosso já tradicional almoço anual. Todos nós esperamos, por todos vós, neste dia. Vamos estar presentes no convívio, não esquecendo todos os que não podem por alguma razão estar presentes com muita pena nossa.

PROGRAMA:
11.00 horas: Concentração largo do tribunal e Rodoviária, junto á estação da

CP.
13.00 horas Almoço – Restaurante Quinta da Gracinda Mateus

Entradas: Rissóis,Croquetes, Morcela, Chouriço, bebidas. Sopa: de Legumes.
Prato de Peixe: Arroz de Tamboril.
Prato de Carne: Vitela Assada C/batata SOBREMESA: Gelado C/Fruta.

BEBIDAS: Vinho branco e tinto, cerveja , refrigerantes, água e café.

18.00 horas – Bolo e champanhe.

SEGUIDO DO ADEUS.

PREÇÁRIO: adultos e crianças + 10 anos --- 22 € --- Crianças dos 3 aos 10 anos --- 10€

Contactos p/ marcação: Marcação até dia 27 de Abril.

Manuel dos Santos Reia da Mata Br. Tapada Municipal, 23

7430-119 Crato
Mail: manuelsrmata gmail.com Tel 245997167 Telm. 939344816

OBRIGADO Crato,16/o3/2o19

José Luís Tavares
Rua Mira Golfe, 176 Vivenda Sol

2765-601 ESTORIL Tel.214685597 Telm. 965119117

Sebastião Alves Lourenço

Vale de Calvo, 98,  2305-162 Tomar —Telm. 922131445

David Martelo

Unknown.jpeg

CAMARADAS E CAMARADOS

    Durante a Convenção do Bloco de Esquerda, o deputado Pedro Filipe Soares iniciou a sua intervenção com o seguinte vocativo: “Camaradas e Camarados”. A expressão causou algum espanto e não poucos sorrisos, mas não demorou muito tempo a percebermos que, para além de se não tratar de um lapso, estávamos no limiar de um novo cenário civilizacional. Em artigo publicado no jornal Público de 20 de Novembro, Pedro Filipe Soares justifica a originalidade da expressão argumentando que “o modelo patriarcal e machista de sociedade modela os idiomas”.

    Depois das consolidadas críticas ao “politicamente correcto”, está aberta a caça ao “gramaticalmente correcto”.

    Habituados aos termos camarada e camaradagem, é altura de os militares se irem preparando para as necessárias mudanças no dispositivo.

    Assim – começando pelo princípio – passará a haver recrutas e recrutos, soldados e soldadas. Não se riam!

    Na instrução, as recrutas armar-se-ão de espingarda e os recrutos de espingardo. A primeira poderá ter baioneta calada e o segundo baioneto calado. Elas terão uma mochila e eles um mochilo. Eles segurarão os calços com um cinto e elas segurarão as calças com uma cinta. Na cabeça usarão boina ou boino.

    Quando forem para o campo, os recrutos montarão bivaco e as recrutas montarão bivaca. No quartel, as recrutas dormirão numa caserna e os recrutos num caserno. Eles irão comer ao refeitório e elas à refeitória.

    Para começar o dia, haverá dois toques: o de alvorada e o de alvorado. À noite, do mesmo modo, haverá toque de silêncio e de silência.

    Nas patentes, também haverá identificação do género: caba/cabo; sargenta/sargento; tenenta/tenento; capitoa/capitão; majora/major; coronela/coronel, etc. Nas unidades haverá um comandante ou comandanta; o primeiro deve ser competente e inteligente e a segunda competenta e inteligenta.

    Se se portarem bem, as recrutas poderão ir de licença e os recrutos de licenço.

    No final da instrução, haverá juramenta de bandeira e juramento de bandeiro. Todos desfilarão garbosamente, eles com o passo certo e elas com a passa certa.

Uff!
David Martelo – 22 de Novembro de 2018

Só pode ser piada

PR01.jpg

 Imagem retirada da NET

 

      A 4 de Março de 2001 morreram 59 pessoas devido ao colapso da ponte Hintze Ribeiro no rio Douro quando estava a ser atravessada por um autocarro e dois automóveis. As averiguações que se seguiram ao acidente apontaram para graves negligências de manutenção a qual, se tivesse sido devidamente efectuada, garantiria o bom estado dessa obra de arte.
      Deste incidente, apesar do tremendo choque causado, resultou apenas o pedido de demissão do ministro do Equipamento Social, um senhor qualquer coisa Coelho que, a propósito, afirmou que a culpa não poderia morrer solteira. O que não viria a acontecer, já que todos os arguidos foram absolvidos. Algo que se compreende porque, no fim da linha, está a responsabilidade do Estado que não dá às suas organizações os meios materiais e humanos para desempenharem cabalmente as suas funções.
      No mês passado, em Ponte de Sor, dois filhos do embaixador do Iraque espancaram um jovem de quinze anos deixando-o às portas da morte. Seguiu-se o alarido do costume mas parece que tudo vai ficar em águas de bacalhau.
      De quando em vez, morre fulminado um jogador de futebol em pleno campo e, que se saiba, ainda ninguém foi responsabilizado.
      Há poucos dias, durante a instrução das tropas de Comandos, dois instruendos morreram em consequência de insolações e quatro foram internados no hospital pelo mesmo motivo. Como sempre nestes casos, gerou-se uma grande algazarra ao ponto de se exigir a crucificação dos Comandos e, se possível, das Forças Armadas. Tudo parece indicar que, se não rolarem cabeças na organização militar, vai ser o fim do mundo.
      Será de perguntar: o que se passa? Será que estas mortes, lamentáveis como tantas outras evitáveis, têm algo especial para merecerem tanto ruído? Será que as Forças Armadas dispoem de recursos humanos e materiais de excelência e não têm o direito de falhar? Será que, desta vez, o Estado está livre de toda e qualquer responsabilidade?
      Não me parece.
      Porém o Excelentíssimo Senhor Presidente da República afirmou há dias o desejo de que as investigações cheguem “até às últimas consequências”. O que só pode ser piada. Porque ele, comandante supremo das Forças Armadas é, por inerência estatutária, o primeiro responsável por tudo o que se faça ou deixe de se fazer nas tropas que comanda. Logo...

Para quem gosta de ler

CqrtasDG.jpeg

Na palidez do amanhecer, a brisa aviva os carvões das fogueiras e abate-lhes o fumo espesso, que rasteja entre as pessoas e as coisas, ocultando-lhes o contacto com a terra. Tudo flutua estranhamente, numa atmosfera irreal que mais afasta a consciência do quadro que quase recusa a admitir. Os tições em brasa são a única pontuação no cinzento geral da manhã.


Daniel Gouveia – “Cartas do Mato”

    É com uma prosa desta qualidade, que Daniel Gouveia nos dá de presente o seu segundo livro “africano”, que nos transporta, mais uma vez, ao âmago da Guerra Colonial (o primeiro livro intitula-se “Arcanjos e Bons Demónios”).
    Poder-se-á dizer que é mais um livro a falar dessa guerra. Mas o que já não se poderá dizer, é que seja um livro a mais.
    Com efeito, uma guerra sofrida durante treze anos, espalhada pelos territórios imensos das antigas colónias de África, na qual participou mais de um milhão de seres humanos (contando com os guerrilheiros), terá fatalmente muito para contar de ambos os lados. Todavia, por mais que se conte, muito mais ficará por dizer. Haverá sempre, portanto, este ou aquele aspecto que vale a pena referir e que não pode cair no esquecimento.
    Foi sobretudo uma guerra de desgaste, travada quase sempre em regiões longínquas e estranhas, onde os nossos combatentes enfrentaram, para lá do inimigo, grandes dificuldades em suportar os efeitos de um clima quase sempre tórrido e desgastante. Guerra traiçoeira, de contornos pouco claros e com grandes variações de intensidade. Intensidade esta que variava de local para local, de dia para dia e, digamos mesmo, de pessoa para pessoa. E uns tornaram-se mais homens enquanto outros se tornaram mais bichos...
    Mais do que a descrição das "aventuras" militares vividas intensamente pelo então alferes Gouveia, temos nesta obra toda a vivência de um cidadão que, não fugindo aos perigos e horrores da guerra, nem por isso deixou de ser quem era: alguém com grande sensibilidade e bom senso; alguém que soube manter, ao mesmo tempo, uma grande serenidade e senso crítico.

A luta armada na Guiné

Com a devida vénia e pelo seu interesse, transcrevo um texto da autoria do Dr. Mário Beja Santos

 

A luta armada na Guiné reexaminada por Mustafah Dhada

 

Beja Santos

 

    Mustafah Dhada é um categorizado investigador de acontecimentos contemporâneos, incluindo as lutas de libertação em África. Pertence ao naipe de nomes sonantes como Basil Davidson, Gérard Chaliand, Patrick Chabal, R. H. Chilcote e Lars Rudebeck que durante e após a luta de libertação se têm debruçado atentamente sobre o ideal revolucionário de Cabral, a forma como liderou, no plano ideológico, militar e diplomático a condução da luta, e a vida do país depois da independência.

    Tomamos a liberdade de pegar num seu ensaio datado de 1998, publicado no prestigiado The Journal of Military History, em que ele procede a um reexame da luta armada, com a finalidade de ver os aspetos essenciais da sua argumentação, ter uma postura crítica face ao acesso às suas fontes e tecer conclusões quanto à premência de os investigadores de diferentes proveniências (incluindo portugueses e guineenses) ponderarem as lacunas inaceitáveis que existem, reapreciarem as fontes consultadas e debateram informalmente o modo de superar fontes propagandísticas, muito úteis para a luta ideológica, inaceitáveis para elaborar uma primeira tentativa da história da Guiné-Bissau a partir da sua luta armada.

    Mustafah Dhada inicia o seu trabalho com a fase de arranque da luta armada e a estratégia seguida. Os dados avançados parecem-me irrepreensíveis. Apostou-se no Sul, pelas suas dificuldades de acesso, desde o segundo semestre de 1962 a sublevação foi destruindo infraestruturas e comunicações, escolheu posicionamento em pontos naturalmente de muito difícil acesso.    Enquanto decorria esta operação a Sul, criava-se a chamada frente Norte, no Oio. Tudo isto decorria ainda com armamento precário, recorria-se ao abatis e às emboscadas do “bate e foge”. O ano de 1963 marca a consolidação no Sul e uma progressiva extensão nas regiões de Cacheu, Bissorã e fronteira senegalesa. Em 1964, a guerrilha estende-se à região de S. Domingos, põe um pé no Gabu, aparece no Boé e ocupa o Corubal. Noutro capítulo fala da estratégia usada para combater a presença do PAIGC no Como e a resistência posta pela etnia Fula ao PAIGC. A economia no interior do país desarticula-se progressivamente, fecham as serrações, não se cultivam bolanhas, desaparecem as destilarias, o comércio do amendoim reduz-se. A resposta de Louro de Sousa e depois de Schulz é a criação de destacamentos, a formação de milícias, a proteção de tabancas, é uma malha de pequenas unidades gravitando à volta de batalhões que procura estender-se pelo território.

    Faz-se aqui uma pausa para mostrar dois mapas. O primeiro, data de 1960 e parece-me demonstrativo da colocação das etnias por todo o território.

 

Guine01.jpg

 

 

  

    Dá-se entretanto uma transformação das FARP, são divididas em três forças regionais em que 200 a 300 militares estacionam nas principais bases do interior. Foram selecionados alvos privilegiados no Boé e na região de Guileje. Recordo que quando o capitão Tomé Pinto (o conhecido “capitão do quadrado”) chegou a Binta, em 1964, os grupos afetos ao PAIGC estavam implantados a escassos dois quilómetros do quartel e circulavam com toda a facilidade entre Binta e Guidage. Schulz obtém de Lisboa um elemento dissuasor fundamental: as bombas de fósforo e mais meios aéreos. O PAIGC é forçado a reduziras as bases, a torná-las mais contingentes, os grupos mais reduzidos, é uma flexibilidade que responde às destruições provocadas pelos bombardeamentos. O Corubal torna-se praticamente intransitável.

    Hélio Felgas, que comandou um batalhão de Bula, escreverá anos depois um livro intitulado “Guiné 1965”, não ilude o tom laudatório para as atividades desenvolvidas na sua área, mas também não esconde que as FARP se aproximam de Bigene, Ingoré, Barro, Binar. No início de 1967, os helicópteros semeiam o terror, é uma arma nova que surpreende a guerrilha quando pretende fazer frente às tropas portuguesas em campo aberto. Vejamos agora um mapa em que Mustafah Dhada mostra a existência de conflito militar em 1967.

 

Guine02.jpg

 

    

    O mapa revela imprecisões, algumas delas com bastante gravidade. Falo elo teatro de operações em que combati, a região do Cuor, limite, no Centro-Norte do mapa, vem lá referido Sinchã Corubal. Do lado de lá de Bambadinca, havia dois destacamentos no Cuor e um no Enxalé. Sinchã Corubal era uma tabanca abandonada, perto ficava o acampamento de Madina e a Norte, numa região profundamente árida, Belel, o início de um corredor que prosseguia por Sara-Sarauol, esta uma posição importante, dispunha de um hospital de campanha. A norte do Cuor havia a região de Mansomine, onde o PAIGC se posicionava sobretudo em Sinchã Jobel. Nós, no Cuor, podíamos calcorrear uma boa parte do regulado, fora dos destacamentos de Missará e Finete, as populações residentes em Madina e Belel vinham comerciar e obter informações nos Nhabijões (portanto próximo de Bambadinca, na outra margem do Geba) e em Mero, também na outra margem, tabanca habitada por população Balanta. Quem olhar para este mapa é capaz de pensar que não havia conflito latente/permanente no Xitole e em toda a região até Geba, em 1967, nada de mais errado. Seguramente que outros combatentes que estejam a ler este texto encontrarão outras anomalias no mapa referente a 1967.

    De 1967 para 1968 assiste-se a uma penetração na região de Teixeira Pinto, no Sul o comandante-chefe Schulz determinou um conjunto de operações com forças especiais e na região Norte entraram em cena bombardeamentos em povoações afetas ao PAIGC próximo de Farim, Bissorã e S. Domingos, suspeitas de abrigar as FARP. Segundo Mustafah Dhada foi um período extremamente difícil para as FARP, perderam abastecimentos, passaram fome, é um período inclusivamente marcado por contestação à estratégia militar no interior do PAIGC. Cabral consegue o reequipamento das FARP e em 28 de Fevereiro de 1968 um comando atacou Bissalanca. Pretextando doença, Schulz retira-se e é substituído por Spínola. Abandonam-se quartéis e posições consideradas inviáveis, redesenha-se a guerra psicológica, reagrupam-se as forças, estabelece-se um plano de reordenamentos, e Dhada traz um elemento novo, o apoio de Spínola a uma força política opositora ao PAIGC, a frente unida de libertação. Dhada como outros autores, labora num equívoco que é atribuir a exclusividade a Spínola da criação de milícias, grupos em autodefesa e a formação de caçadores nativos, de um modo geral esta africanização já estava em curso no tempo de Spínola o que este conseguiu foi obter financiamento para acelerar a africanização inclusive ao nível das tropas de elite. Dhada, não se sabe qual a fundamentação e os documentos em que baseou, dá como certo e seguro a constituição da FUL onde cabiam dissidentes do PAIGC, Rafael Barbosa e nacionalistas guineenses.

    A operação de ataque a Conacri acabou por minar a política externa portuguesa, teria começado aí a congeminação do plano para chegar às negociações diretas com Cabral, entretanto a agressividade militar de Spínola parecia imparável, o que obrigou a uma nova reformulação das FARP. Dhada fala sistematicamente das operações anuais das FARP, omite as operações de iniciativa portuguesa, o que é incompreensível em historiografia militar. Temos as conversações com Senghor e refere-se um plano para dividir o PAIGC entre a ala cabo-verdiana e a guineense, seria com esta, segundo Dhada, que Spínola contaria preparar um plano de autodeterminação.

    Em Janeiro de 1973, tudo vai mudar com o desaparecimento físico de Cabral, o PAIGC envereda por ataques seletivos, cria infernos à volta desses objetivos selecionados. O autor detém-se sobre os acontecimentos de Copá, em Janeiro de 1974, os bombardeamentos sistemáticos das FARP e as emboscadas próximo de Pirada bem como a coluna vinda de Bajocunda em direção a Pirada que foi brutalmente atacada. Dhada refere um número de baixas para os efetivos portugueses que é manifestamente delirante, em 1973 diz que o número ultrapassou os 2 mil mortos, o segundo mais alto desde o início da guerra armada (!), isto quando há muito tempo já há dados sobre os mortos portugueses em campanha.

    O que se pode depreender de um trabalho onde há uma indiscutível investigação séria, mas onde existem lacunas relativamente ao comportamento das Forças Armadas portuguesas (nem uma só palavra sobre o papel da Marinha que, como é de todos sabido, foi primordial), onde se usam mapas fantasiosos? Tudo leva a querer que personalidades como Mustafah Dhada, Julião Soares Sousa, António Duarte Silva, Leopoldo Amado, historiadores militares portugueses como Aniceto Afonso e Carlos Matos Gomes conversassem entre si, sobre as fontes probatórias e aquelas que ainda estão inquinadas pela propaganda (não é a primeira vez que vejo escrito que as tropas portuguesas tiveram 650 mortos no Como entre Janeiro e Fevereiro de 1964), e que depois de laborioso acerto sobre o rigor dos dados transmitissem o produto das suas reflexões para meio universitário e para as opiniões públicas dos dois países mais afetados pelo que aconteceu naquela luta armada, a Guiné-Bissau e Portugal. Quanto ao mais, de boas intenções está o inferno cheio.

 

Recomendo a todos os interessados a leitura integral do ensaio de Mustafah Dhada no site:

https://www.academia.edu/4022011/Mustafah_Dhada_The_Liberation_War_In_Guinea-Bissau_Reconsidered_Journal_of_Military_History_62_3_Summer_1998_571-593

  

Dhada.jpg

Mustafah Dhada

 

Para quem gosta de ler

    Beja Santos, ex combatente da guerra colonial, lançou ontem um novo livro. Trata-se de um levantamento do muito que foi escrito sobre essa longa e dolorosa guerra.

A não perder.

BejaSantos.jpg

BejaSantos2.jpg